domingo, 31 de agosto de 2008

Editorial - edição de reinauguração

As recentes leituras que fiz de alfarrábios sobre o sarcasmo congênito das hienas africanas têm me feito muito bem; minha depressão nunca esteve tão indisposta. Munido deste sentimento de confiança, vou expor ao leitor minha tentativa de “autoterapia”. Deixarei escapar algumas palavras pela técnica psicanalítica da “livre associação” para empregá-las, de forma aleatória, como palavras-chave neste texto. Vou discorrer a partir delas, tentando descobrir sentimentos e memórias reprimidas. Caso não consiga, tornar-me-ei amigo da bebida e abdicarei a esta pretensiosa vida de literato de orkut. Que comece a sessão.

Política. O centro acadêmico tem tido um papel do destaque neste momento ímpar para a universidade. Através de assembléia geral, a diretoria pôde assumir uma posição clara nas eleições para o DCJ e reitoria da Ufpi; afinal, uma entidade que hasteia a bandeira de luta pelos direitos dos estudantes não deve omitir-se ou acomodar-se com o falso discurso da neutralidade.

Integração. Esta é condição necessária para que haja uma verdadeira força política no curso de direito. Em 10 meses de mandato, a atual gestão do CA realizou dois interperíodos de futebol de salão. Ora, é sabido por todos que a atividade esportiva, além de ser lúdica e saudável, proporciona um rápido entrosamento entre alunos. Outrossim, para fortalecer ainda mais o sentimento de unidade, foi reativada a “semana do calouro” - que têm se mostrado importantíssima para uma recepção calorosa aos novatos.

DCJ. Há cerca de três meses, houve eleições para chefe e subchefe do Departamento de Ciências Jurídicas. Com apoio incondicional de professores e alunos, foram eleitos os professores Nelson Matos e José do Monte Vieira, respectivamente. Este, trazendo longa experiência, e aquele, representando a “força jovem” (como diria o próprio Prof. Monte), têm um grande desafio pela frente: ajudar a implantar um novo paradigma no curso de Direito. Sem dúvida, o modelo de gestão que vigora está em crise, visto que alguns conceitos e convicções que perduram desde a velha Faculdade de Direito do Piauí têm se mostrado incompatíveis com a realidade atual. No último exame da OAB - que avalia os requisitos para o exercício da advocacia – a média de aprovação da UFPI foi de 67,31%, apenas 2% a mais do que a segunda colocada. Este quadro, que vem se construindo gradativamente, demonstra que, no mínimo, as faculdades particulares têm evoluído numa proporção maior que a nossa.

Futuro. Segundo Immanuel Kant, "Toda reforma interior e toda mudança para melhor dependem exclusivamente da aplicação do nosso próprio esforço”. Dessa forma, é necessário que assumamos a responsabilidade que temos no destino da universidade. A partir de agora, devemos vestir a camisa da campanha de valorização do curso e defender ferrenhamente o lugar que conquistamos. Este é o momento. Se conseguirmos conciliar os interesses de professores e discentes, formando uma parceria entre CA e DCJ, este curso será referência no Brasil, desta vez de forma indiscutível.

Pois bem, chegamos ao fim da terapia. Ao analisar este texto e alguns comportamentos recentes, concluo que talvez não seja mais aquele exímio cafajeste. Temo estar me apaixonando por esta instituição; isto deve ser o motivo de minha histeria.


Ricardo Alves
Diretor do CACC e estudante do 4º período.

Perdi

Nunca tinha pensado

Que gostaria de ti como eu gosto

Perdi o senso do sério

Sentia vários perfumes estranhos

Na minha ressaca ressentida

Não tinha mais o sentimento de verdade

Escutava passos

Não sabia de onde vinham

Diferenciei os teus no meio de milhares

Quando sai correndo da multidão

Quase fui atropelada por um exército de apaixonados

Quando a lua surgiu

Teu sorriso de luz veio até mim

Parecia à lua nos pregando uma partida

De repente senti teus braços fortes

Senti teu perfume que não se confunde

Teu andar me seduz de todas as formas

Nessa noite cai nos teus braços

Num sorriso levantei-me do chão onde estava

Adormecida, sei que não passa de um sonho

Não me pertences

Meu coração bate forte por algo perdido

Por algo que não tem volta

Não tinha percebido quando o chão se abriu

E me meti na sua vida

Reconheço que não foi de melhor recepção

Perdi-te por uma hora, por um minuto, para sempre

Agora me recordo de quando conversávamos

Até isso perdi

Enfim agora precisarei de me achar

Porque eu estou contigo

Dificilmente me encontrarei

Quando te perdi meu coração foi junto

Encontro-me num labirinto

Gritas por mim e eu por ti

Mas teu grito afasta-me

Não tens o que eu quero para mim

E as portas da masmorra do labirinto se fecharam pra mim

Entrei num museu de quadros e lagartos

Onde não sairei nunca mais.

Jocilene do Rosário Gomes

Estudante do 4º período

Natureza Jurídica da Interpretação Analógica


Uma interessante discussão doutrinária me chamou atenção nos últimos dias, principalmente por servir de alguma utilidade para o propósito do presente trabalho. É a distinção, na hermenêutica, de analogia e interpretação analógica e a natureza jurídica desta. Porém, diante da diferenciação é necessário discorrer sobre alguns aspectos implícitos dos institutos como a noção de lacuna e também algumas interpretações particulares a cerca dos próprios institutos.

De forma profunda, o glorioso Hans Kelsen traz em seu livro “Teoria Geral do Direito e do Estado” a construção, bastante convincente, de que a idéia das lacunas do direito é uma ficção. Primeiramente, ele destrói a idéia superficial de que a falta de aplicação do Direito seria a prova de sua lacuna, e muito pelo contrário, tal posição estaria a afirmar a completude do direito, pois o juiz aplicaria apenas o direito vigente, completo, uno e coerente. Em segundo lugar, de acordo com essa conclusão, dar-se-ia duas possibilidades logicamente possíveis por parte do juiz: 1) a possibilidade de criar, na condição de legislador, direito novo para o caso concreto; 2) a possibilidade de recusar a ação a pretexto de que o direito vigente não regula tal fato.

A primeira possibilidade do juiz seria plenamente válida, pois a norma superior, criadora de normas gerais, em seu sentido dinâmico, estipularia a competência do juiz para tanto (validade formal, lógica). Respeitada a premissa, o juiz criaria norma individual para o caso concreto. Todavia, malgrado seja a alternativa válida, seria inadequada jurídica e politicamente. Vale lembrar que esta possibilidade é obrigatória no Brasil pelo princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional.

Na verdade toda dessa discussão significaria a admissão por parte do legislador de sua impossibilidade de criar normas gerais para todos os casos (primeiro inconveniente) o que poderia levar a resultados justos ou iníquos. Assim, o que o legislador quereria era evitar decisões injustas e iníquas, transportando assim para o juiz a competência criadora (segundo inconveniente). Ocorre que isso levaria ao arbítrio do juiz na aferição dos casos concretos e na possibilidade de interpretações contra legem. Para evitar os dois inconvenientes cria-se, destarte, a ficção da “lacuna do direito”, onde os juízes só supririam a lacuna do legislador, não podendo o substituir, e não deixando de aplicar o direito, regulado agora a todos os casos, a fim de evitar injustiças. Todavia faz-se a ressalva de que não se sabe o que seria mais injusto para determinados casos: a falta de aplicação, ou a aplicação forçada.

Temos, portanto, uma ficção de que existe uma lacuna na lei (para a imensa maioria dos doutrinadores, ao contrário, a ficção é o ordenamento jurídico não possuir lacuna, porém adoto a posição kelseniana). Existe essa lacuna e ela tem de ser suprida por institutos de integração do direito, dentre eles a analogia.

Eugenio Raúl Zaffaroni também tem um entendimento bastante particular a cerca deste estudo. Agora concernente à analogia em si, como princípio a que se deve ajustar toda interpretação da lei penal. Afirma o autor, que a analogia corretamente analisada, não se trata de princípio obtido dogmaticamente, mas de princípios que são anteriores à aplicação do método e que condicionam o objeto do conhecimento. Ou seja, na interpretação da lei penal sempre deve haver analogia, diferentemente do entendimento majoritário (que a interpreta de outra forma). São palavras do autor, in verbis: “Se não aplicássemos a analogia na lógica jurídica, nosso trabalho seria praticamente irrealizável, porque o pensamento humano recorre iniludivelmente à analogia; a comparação é imprescindível ao raciocínio”.

Convém afirmar, contudo, que a analogia tratada nos manuais e majoritariamente entendida na doutrina é a decorrente da lição clássica de Carlos Maximiliano, aperfeiçoada por outros juristas posteriores.

Já dizia o mestre Carlos Maximiliano, que “a analogia enquadra-se melhor na Aplicação do que na Hermenêutica do Direito”. O escopo de tal instituto não seria o de descobrir/revelar o sentido e alcance das normas positivas, seria, porém, o de suprir as lacunas dos textos legais. A analogia se operaria baseada em uma indução sui generis (indução incompleta), enquanto o intérprete operaria dedutivamente. Já diferenciava também a analogia legis (falta apenas uma disposição ou artigo de lei recorrendo-se, o intérprete, ao que regula um caso semelhante) da analogia júris (não existe nenhum dispositivo aplicável à espécie encontrando-se, o intérprete, em face de direito novo).

Pela finalidade deste texto é de pouca utilidade a última distinção. O que vale é idéia do instituto analogia ser conceituado meio de integrar o direito, o que significa a possível existência de lacunas no ordenamento jurídico que devem ser supridas pela analogia. Entretanto, não é tão simples identificar uma lacuna, pois tal atividade cognitiva varia de intérprete para intérprete segundo sua forma de interpretar e suas convicções.

Aníbal Bruno tem entendimento semelhante, onde afirma que a analogia é um processo que visa a cobrir a lacuna da norma, não pela criação de nova lei, mas pela aplicação de lei que regule casos semelhantes, subindo até os princípios que informam esta lei, para fazer derivar deles a regra aplicável ao caso vertente. Entretanto o uso da analogia não se daria apenas nos casos da aplicação analógica, mas também em casos de interpretação, onde se busca o sentido e o alcance das normas. Esta seria a interpretação analógica.

Neste sentido, a interpretação por analogia se verifica “quando a norma dispõe que o seu preceito, além dos casos especificados, se aplique também a casos semelhantes, usando esta expressão ou expressões equivalentes” (BRUNO, p.136). Assim, consoante se emprega a analogia nestes casos o conteúdo da norma se completa, se estende.

Para o autor e quase a totalidade da doutrina a interpretação analógica é considerada como espécie da interpretação extensiva, tratando-se de uma hipótese em que a própria lei manda que se estenda o seu conteúdo fornecendo o critério para isso. Os resultados seriam os mesmos – A extensão do sentido e alcance da norma.

Neste contexto, percebe-se claramente que a interpretação analógica não tem natureza jurídica de integração/aplicação do direito e sim de interpretação. Mas mais do que isso, a doutrina majoritária entende a inclusão desse meio de interpretação na natureza de interpretação extensiva. Entretanto não seria estranho classificá-la como interpretação sui generis, visto que a sua semelhança é apenas quanto ao resultado, sendo diverso no restante como na origem, nos critérios e nos limites. A origem da interpretação extensiva parte da vontade do intérprete, enquanto na interpretação analógica parte da vontade da lei. Os limites não são identificáveis, porquanto haja a variedade no uso dos meios de interpretação conhecidos (clássicos, filosóficos, constitucionais), enquanto os limites desta são as cláusulas genéricas. Por fim, o critério da primeira é a razoabilidade no uso dos métodos, enquanto o do segundo é deduzido da própria norma.


Antônio Júnior (8º período)

Entrevista com o Prof. Fonseca Neto

A equipe do Libertas entrevistou o Prof. MSc. Fonseca Neto, atual Diretor do CCHL e professor do departamento de Geografia e História. Surpreendentes relatos de uma vida de militância contra a ditadura e uma análise conjuntural do mundo universitário foram os principais resultados deste trabalho.

LIBERTAS: como foi sua trajetória acadêmica e política na UFPI?

FONSECA: Eu ingressei na Universidade como estudante de História em 1975 e de Direito em 1977. Em 74, havia entrado numa autarquia federal chamada Colégio Agrícola de Teresina, que mais tarde foi incorporada à UFPI; tornando-me servidor federal.

Desde abril de setenta e sete, já se falando em distensão da ditadura, houve uma conscientização mais intensa dos estudantes para a luta política e um engajamento maior contra o autoritarismo militar. Este foi o ano em que concorri à minha primeira eleição na universidade e me tornei Secretário Geral do Diretório Setorial do CCHL. Mais tarde, concluída a Licenciatura em História, eu deixaria o quadro do CAT para tornar-me docente da Ufpi, vindo depois para o Departamento de Geografia e História. Foi essa a minha trajetória e militância dos primeiros anos, que, aliás, havia culminado com minha eleição para a primeira presidência do DCE-Livre.

A luta contra a ditadura era em prol de um Estado de Direito, da constitucionalização do país, da retirada do entulho autoritário, pela constituinte e pela anistia; estes eram os objetivos centrais pelos quais se lutava na universidade. O curso de Direito, do qual participei no fim dos anos 1970, começo dos 80, era muito fiscalizado e interpenetrado de policiais; inclusive polícia-política; mas isso não impediu que parte de seus alunos assumisse uma posição central nessa luta. Foi o tempo, por exemplo, que nós recriamos o Centro Acadêmico de Direito, tendo sempre em vista a oposição à ditadura.

Então, eu me insiro nessa peleja dos estudantes, dos professores, por entender que a universidade é um espaço de construção da cidadania, do novo Brasil e das possibilidades intelectuais voltadas para a prática de um país democrático e livre.

LIBERTAS: Quais são as atribuições de um diretor de Unidade de Ensino, a exemplo de um diretor do CCHL?

FONSECA: Suas atribuições são coordenar as políticas de ensino, extensão e pesquisa da Unidade e administrar o cotidiano da vida do Centro. Neste âmbito, o diretor deve ter o poder disciplinar e competência administrativa, além de ser o representante de sua unidade nos colegiados superiores e perante o conjunto da sociedade. Todas estas funções são exercidas na sua plenitude dependendo da postura da Administração Superior. Mas porque estou fazendo este registro?

Bem, o Estatuto da universidade, ao mesmo tempo em que delega esse conjunto de atribuições muito sérias a um diretor de Centro, confere um papel de centralidade muito grande ao reitor. Consideramos isso grave, sobretudo no caso do CCHL, porque não tem um diretor seu, a menos que vire amigo pessoal do reitor, a plena condição para exercer suas atribuições consoante o mandato que possui, isto por falta de recursos financeiros para tanto e porque o reitor centraliza esta execução de forma profundamente autoritária e antidemocrática. Esta é uma das coisas dramáticas que a estrutura da universidade tem e que precisa ser imediatamente transformada.

LIBERTAS: Quais são as dificuldades que tem um diretor de Centro? E, ainda, quais delas são prementes resolver para a melhoria da Universidade?

FONSECA: Bem, as dificuldades decorrem do que eu havia dito respondendo à pergunta anterior: a centralidade enviesada pelo autoritarismo, nas raias do despotismo.. E, no nosso caso, isso está piorado no presente contexto, porque o reitor tem com nosso Centro uma desconfiança absurda que nasce de uma incapacidade dele de compreender o que é o CCHL. Ele entende, de maneira distorcida, que o CCHL é um centro questionador e que a pratica da discussão tem um sentido do não se fazer nada. Quando o Reuni foi colocado, o CCHL foi o único lugar da universidade onde ocorreu um inicio de discussão e nós buscamos o alargamento desta, queríamos tal discussão nos Conselhos da UFPI. Resultado: a reitoria desconsiderou esta posição de maneira grosseira perante o Conselho Universitário. E isso foi apenas um exemplo da postura que ela tem assumido, uma postura segundo a qual discutir é uma verdadeira perda de tempo.

Ao mesmo tempo, ele implementa políticas passando por cima da Diretoria, tentando conquistar ali uma base de apoio a partir de uma postura meramente cambista. Ora, tudo que a Reitoria parece querer, em particular o reitor, é que o diretor tivesse com ele uma relação de maior pessoalidade, para que conversássemos, o Fonseca e o Junior, e não o diretor do CCHL e o reitor da universidade. Por que isso? Porque um diretor de Centro é eleito e, por essa razão, não é um assessor do reitor no sentido dos cargos de confiança.

Existe, a partir disto, uma incompreensão de base autoritária por parte da reitoria, sendo que isso agora está se agravando, porque a universidade voltou a ser financiada. O reitor está com as mãos cheias de verbas! Ele ultrapassou os limites da equidade administrativa: sonegou ao CCHL por três anos coisas mínimas, para, na véspera das eleições, encaminhar uma reforma há muito tempo solicitada por professores, alunos e pela direção do Centro. Lutamos por muitos anos, durante a ditadura, para conquistar nossos direitos e vemos hoje ressurgir na universidade um clientelismo tosco, a reoligarquização de nossos espaços de convivência e decisão.

O CCHL concentra o que há de melhor em pensadores sociais em nosso meio. O que precisamos é construir um protagonismo de intercâmbios ainda mais intensos com a sociedade complexa, o que é um desafio para a universidade. É que ficamos ensimesmados e não conseguimos colocar de maneira satisfatória a universidade nas ruas, que é o lugar dela. Hoje, a cidade está cheia de cursos, está cheia de faculdades, já tem outra universidade pública importante que é a UESPI e sobre a Federal se exige novas e melhores respostas sobre este contexto. A questão da pós-graduação é fundamental, novos programas devem ser criados e este é um desafio novo da UFPI; mas, junto a ele, vem o desafio grande de não fragilizar a graduação. Na área de Direito, por exemplo, não se pode esquecer as possibilidades da extensão e pesquisa jurídica. Estes são espaços disponíveis na Universidade Federal do Piauí que nenhuma faculdade particular supera. As faculdades particulares apresentam, em geral, melhores condições físicas e, às vezes, melhores acervos de biblioteca, mas nenhuma tem os professores que nós temos. Dentro da Universidade Federal estão cinco dos sete únicos doutores em direito do Piauí. Qual o diferencial do curso de direito da UFPI? A possibilidade para que os professores façam pesquisa ou extensão. Sem falar que o CCHL é um campo de experiências, cruzamento e interacionismos culturais muito intensos e sólidos que o curso de Direito precisa aproveitar.

LIBERTAS: Como foi a postura do movimento estudantil desde a década de 1970? E quais as perspectivas sobre os estudantes atuais?

FONSECA: Ainda na década de 1980, houve lutas pela democratização da universidade, por concursos para professores, concursos de servidores, RU, o fim das taxas pagas por disciplina, e todas estas conquistas foram fruto mais da articulação e mobilização estudantil que docente. Por que isso? Por que a juventude, sem dúvida, orienta a sua atuação política num sentido muito mais libertário do que aqueles outros sentidos que a corporação universitária tem.

Todavia, o individualismo de viés neoliberal tem dominado, atualmente, o cenário universitário, mitigando a construção coletiva. Boa parte dos alunos e professores de hoje estão cada um no seu canto, fazendo suas pesquisas num horizonte mais de busca individual, querendo ficar grande ou apenas desejando um ponto a mais em seu currículo pessoal, parece que pouco importando os signos do coletivo humano. São coisas que perpassam nosso tempo, criando certa perplexidade; mas que não podemos evitar, simplesmente. Temos que buscar compreender o contexto e, a partir disso, fazer nossas escolhas. Se observarmos bem, não há nenhum momento na história do Brasil em que o viver nacional tenha uma expressão de liberdade pública constitucionalizada como o atual. Porém, isso foi uma conquista e, como tal, não deveria causar acomodação, ou seja, não deveria se perder o enfoque da construção coletiva que significa.

Não seria apropriado dizer que o movimento estudantil está em decadência e que não é mais o que era. Isto significaria ignorar o sentido da História que é construção na direção do novo. O que se faz necessário é a descoberta de seu papel sobre esta nova conjuntura e, evidentemente, uma constante autocrítica da pertinência e legitimidade de suas opções presentes. Os representantes de diretórios acadêmicos devem estar próximos das mentes e corações que representam. Somente assim poderão exercer legitimamente suas funções.

O Libertas: o amigo do povo.


Por Éfren Paulo Porfírio de Sá Lima [1](*)

Tendo me proposto a participar dos esforços na retomada do combatente “O Libertas”, fui premiado com o artigo que deve dedicar-se a narrar um pouco de sua trajetória.

Quando cheguei na UFPI nos idos de 1989, O Libertas já tinha identidade: órgão oficial de comunicação da representação estudantil do curso de direito. Enquanto tal, assumia o papel destacado de meio de divulgação das idéias políticas do grupo dirigente do CA de Direito, à época CARREM (Centro Acadêmico Rosmarino do Rêgo Monteiro), e, ainda, servia de espaço para a divulgação de trabalhos científicos dos alunos, das atividades culturais desenvolvidas, espaço para os poetas bissextos... Até com charges o jornal circulava.

O Libertas era um jornal “do contra”, e nisso era bom! Com linha editorial bem definida, era contra a Chefia do Departamento, contra a Coordenação do Curso, contra a Direção do Centro, contra a Reitoria e, ainda, contra a pena de morte. Isso mesmo! Em todos os impressos do CA, inclusive em O Libertas, constava a expressão “Diga não à pena de morte!”. Foi a maneira encontrada pelo CA de marcar posição contra o debate a respeito da tentativa de revigorar a pena de morte no Brasil. Para os adversários, o órgão oficial de comunicação do CA era chamado, pejorativamente, de “jornalzinho do CA....”, porquanto sempre batia no descaso da administração quanto aos assuntos de interesse dos alunos do Curso de Direito, a saber: precária estrutura física, bibliografia ultrapassada e escassa, alguns professores que não compareciam às aulas, omissão da Coordenação e do Departamento na tomada de providências para solução desses fatos, etc... Ou seja, O Libertas era um jornal que cuidava da política estudantil, mas não descuidava de enfrentar, no plano das idéias e das ações, os temas postos em debate na sociedade, à medida em que os alunos de direito, e sua representação, tinham a consciência do papel de ator social que cumpriam desempenhar.

O Libertas tinha lado, apanhava, sofria críticas. Mas era firme, não arredava o pé na defesa das posições políticas do CA. No meu tempo, tínhamos a clareza de toda uma luta anterior travada pelo O Libertas contra a ditadura, pela realização de eleições diretas para reitor, pelo aumento na oferta de linhas de ônibus para o Campus. Não havia como negar ou simplesmente abandonar essa tradição. Daí toda a discussão em torno do chamado direito alternativo, uso alternativo do direito, positivismo de combate, etc., que minha geração foi partícipe e prontamente acolhida nas páginas de O Libertas.

Deixei de ser aluno em 1993 e em 1994 retornei à UFPI na condição de professor de direito civil. Nesse período O Libertas continuava vivo, combatente, ameaçado de processo judicial por alguns poucos que se sentiam atingidos pelas verdades estampadas nos artigos e editoriais veiculados. Passaram-se os anos e eis que O Libertas foi silenciado. Não pela censura do governo militar, mas por pura falta de atitude dos alunos do curso de direito, que preferiram o debate restrito, no anonimato, aquele que se passa nos corredores do CCHL, ou o que é travado, de forma belíssima, na “lista” de email da qual tenho a honra de participar e que acho que não disputa espaço com O Libertas.

Ao ser beijado pelo príncipe encantado, O Libertas que acorda deve servir de ponto de confluência das vontades individuais e coletivas em busca da melhoria de nosso Curso. Deve reacender a chama da indignação contra as injustiças, deve pugnar pelo estado democrático de direito, deve engajar-se na luta dos excluídos, deve servir de ponte entre os alunos, a administração, os professores e a sociedade em busca da excelência do curso de direito.

Enfim, espero e tenho crença que os alunos e o CA sejam o nosso Marat, e que O Libertas reassuma o seu papel de defensor dos interesses do curso de direito da UFPI e das causas da justiça, assim como o Amigo do Povo, fundado pelo revolucionário jacobino, revelava-se defensor das causas do povo francês.

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A polêmica do quinto constitucional

Piauiense Roberto Freitas mais uma vez indicado à lista sêxtupla para ministro do STJ e a polêmica do quinto constitucional.

Desde meados de fevereiro acompanhamos o impasse histórico entre o Supremo Tribunal de Justiça e a ordem dos advogados do Brasil. Os ministros do STJ não quiseram escolher nenhum dos nomes indicados da lista sêxtupla pela OAB, na qual figura o nome do nosso ilustre professor Roberto Freitas. A devolução da lista pelo STJ, fato este sem precedentes históricos desde 1934 quando foi estabelecido na constituição que um quinto da composição dos tribunais superiores seriam preenchidos por membros do ministério público e advogados (artigo 94), gerou muita polêmica entre os meios jurídicos. A maioria dos ministros do STJ votou em branco nos três escrutínios realizados. Resultado: nenhum dos seis indicados pela OAB alcançou a maioria absoluta necessária dos votos e, portanto, não foi formada a lista tríplice. Resta agora esperar que o Supremo Tribunal Federal resolva este impasse.

A decisão do STJ foi infundada e arbitrária já que todos os candidatos preenchiam os requisitos constitucionais necessários para sua escolha. O STJ não teve o trabalho de sequer apresentar argumentos para a devolução da lista. Isto fere o principio da ampla defesa e do contraditório, pois, ao não se estabelecer as razões da recusa, impede a OAB de sindicar em juízo o ato praticado. Para Cezar Britto, presidente da OAB, os candidatos foram recusados pelo critério da querência, ou seja, o STJ simplesmente não quer os candidatos. O regimento interno do STJ não prevê, em momento algum, a devolução da lista à OAB para que seja escolhida outra. Isto fere o regimento interno do tribunal, ato este ilegal. A constituição assegura a OAB o direito de ter sua lista apreciada pelo STJ. Este deveria ter feito quantas votações fossem necessárias para que a lista tríplice fosse formada como afirma o regimento interno. Além disso, também fere o princípio da paridade, pois a lista tríplice dos juizes e dos representantes do ministério público já está formada, apenas esperando apreciação do presidente da república. Não cabe ao STJ dirigir a indicação feita pela OAB. É lamentável que o quinto constitucional não seja respeitado, medida indubitavelmente democrática.

A saber, dois nomes da lista são notoriamente conhecidos no meio jurídico. Um deles é Cezar Roberto Bitencourt, reconhecido autor na área criminal, natural do Rio Grande do Sul. É doutor em direito penal pela Universidade de Sevilha e escreveu a obra “Tratado de Direito Penal”. Outro que se destaca é o piauiense Roberto Gonçalves de Freitas Filho (*), pós-graduado em direito civil pela Universidade Católica de São Paulo, autor de “Sigilo Profissional” e “Ética e Advocacia Pro Bono”, professor da Universidade Federal d Piauí, indicado em 2006 a lista tríplice do STJ.

(*) Nota do Editor: Exerceu os cargos de Reitor da escola superior de Advocacia do Piauí (Esapi) e de presidente da Comissão Nacional de Direitos Humanos da OAB. Atualmente, é defensor público no estado do Piauí e professor do curso de direito da UFPI. Conquanto sua respeitável formação acadêmica, este eminente jurista piauiense se destaca sobretudo pela extensa experiência prática, referendada numa advocacia militante, baseada no respeito aos conceitos éticos da sociedade e aos princípios constitucionais.

Evaldo Pádua
4º Período

quarta-feira, 28 de maio de 2008

o bolo de consciência limpa

O clima infernal – digo, tropical – parece aumentar a energia cinética das idéias. Olho ao redor e vejo uma possível valorização das ações da Embraer, assim como o crescimento exponencial de evangélicos, emos e, a não menos importante, aproximação das eleições do departamento de ciências jurídicas. Escolhi um tema ao acaso e aqui estou, falando sobre o contexto que antecede as eleições, marcada para os dias 9 e 10 de abril.

Pois bem. Nossa instituição está longe da perfeição, é verdade. Mas o problema da falta de mobilização estudantil precede qualquer outro, principalmente quando se considera o momento que vivenciamos.

A verdade é que os alunos do nosso curso às vezes me lembram Mersault, personagem do livro “O estrangeiro”, de Albert Camus (vocês leram a matéria anterior? Coincidências existem!). Sua indiferença para com os problemas do curso muitas vezes me assusta. Mas será que isso acontece por que ser “blasé” está na moda? Quem sabe. Uma conjetura: Talvez o Sol, que atormenta e influencia diretamente a vida de Mersault, possa ser substituído pelo doce perfume de excrementos felinos que proporcionam campeonatos de apnéia nos corredores do CCHL.

Outro dia os alunos de medicina fizeram greve. Você não entendeu errado, amigo leitor, os ALUNOS fizeram greve. Mas por que isso parece tão estranho para nós, que estudamos filosofia, ciências políticas e adoramos proferir um enorme “blábláblá” sem erros ortográficos?

É claro que não podemos nos comparar a um estudante de 1989, que sofre influências da queda do muro de Berlim, do fim da ditadura e da tão promissora constituição de 1988. Hodiernamente, qual notícia é mais importante: o “paredão” do Big Brother ou a intimidade de Britney Spears? Não sei, mas duvido muito que um estudante de Direito que esteja alheio à política da universidade esteja preparado para ajudar a tornar o Brasil mais justo.

Segundo Napoleão, todo homem luta com mais bravura pelos seus interesses que pelos seus direitos. Suponhamos que os interesses da maioria dos estudantes sejam guiados apenas pela cegueira dos concursos, e que estes desconheçam a abnegação. Será que nesse caso nós não poderemos atingir mais facilmente nossos interesses lutando pelos nossos direitos?

Devo lembrá-los que quando falo em “estudantes” me refiro também ao autor deste texto - que saiu, mas volta logo. Assim, me parece que se tivermos uma diretoria do CACC organizada e um jornal, que através da circunspeção e ousadia (por que não?), possa cativar o leitor, provavelmente vivenciaremos grandes transformações. “A esperança é o pão sem manteiga dos desgraçados” – assinala o Barão de Itararé. Quem se importa?

Nos últimos concursos públicos voltados para a área jurídica se observa que nossa instituição não predomina como antes. Temo que algo só seja feito quando o índice de aprovação da OAB não nos favorecer, pois aí pode ser tarde demais.

Dessa forma, concito meus colegas a fazer a sua parte, que no momento consiste em votar. O fato insólito é que pela primeira vez em dez anos não haverá chapa única. Esta é a nossa chance de dar a volta por cima e sair da universidade com o diploma de bacharel em cidadania.

...Ricardo Alves... (riamm@hotmail.com)
Diretor do CACC e aluno do 3º período